Mensuração de autorregulação fria (funções executivas)
O Projeto Adole-sendo adaptou, para uso no Brasil, várias tarefas de avaliação de funções executivas frias que são de domínios público (podem ser usadas sem custo por qualquer um).
O conjunto desses testes/tarefas compõem a bateria FREE (free research executive evaluation).
A publicação que deu origem a essa bateria é Zanini et al. (2021), que contém links para baixar os testes, manuais de administração e correção.
Para aumentar o alcance desse material, disponibilizamos e-books gratuitos em português a respeito da bateria FREE.
O Volume 1 trata das bases teóricas e descrição dos testes.
O Volume 2 é um manual de aplicação e correção e inclui desempenho ao longo da idade em adolescentes com desenvolvimento típico de 9-15 anos.
Daremos a seguir uma explicação resumida sobre a bateria FREE.
Os testes dessa bateria foram adaptadas para uso no Brasil a partir de testes selecionados de publicações sobre o funcionamento executivo que envolvem análises confirmatórias de um modelo teórico chamado ‘unidade e diversidade de funções executivas’. Esse modelo propõe o fracionamento dessas funções cognitivas em vários domínios distinguíveis, mas interrelacionados: alternância, atualização e inibição de respostas prepotentes ou automáticas (para uma visão geral, ver Friedman & Miyake, 2017).
Resumidamente, alternância executiva é a habilidade de alternar entre atividades, aplicação de regras, etc.; atualização é a habilidade de manter em mente somente conteúdo necessário para realizar uma tarefa, removendo conteúdo irrelevante; inibição é a habilidade de conseguir evitar agir automaticamente.
A bateria FREE tem duas tarefas que mensuram cada uma dessas três habilidades executivas. Deste forma, aqueles interessados em obter melhores medidas de funcionamento executivo podem escolher determinar uma variável latente a partir do desempenho em cada par de tarefas que medem o mesmo domínio.
As tarefas foram concebidas de modo a evitar os efeitos teto e chão (isto é, que os examinandos atinjam escores máximos ou mínimos), tendo sido testadas em estudos-piloto em crianças a partir dos 7 anos, idosos com baixa escolaridade e jovens adultos altamente escolarizados. No entanto, os dados normativos ainda não estão disponíveis, pois este é um projeto em andamento. Portanto, as tarefas descritas aqui são úteis principalmente para fins de pesquisa e devem incluir grupos controle com características semelhantes às da população sob investigação.
Nessa bateria de testes, as respostas dos examinados são orais. A razão para isso é obter medidas de funções executivas que são pouco contaminadas por diferenças individuais em fatores como velocidade psicomotora, coordenação, destreza e lateralidade, que variam entre os sexos, mudam ao longo do desenvolvimento e podem ser afetadas pela escolaridade (por exemplo, Ruff & Parker, 1993; Sullivan et al., 2016), possivelmente independentemente do funcionamento executivo.
Incluímos, assim, apenas tarefas que não envolvem tempo de exposição fixo (self-paced) e usamos o tempo necessário para concluir as tarefas como medidas de desempenho, juntamente com a acurácia das respostas. Os examinados passam de uma tela para outra deslizando a tela com o dedo, pressionando a barra de espaço, clicando no mouse ou virando as páginas no caso de versões impressas em cartões. No canto inferior direito de cada tela das tarefas há uma imagem que indica que é preciso mudar a folha para continuar. Os examinadores tomam nota das respostas orais nas folhas de respostas que também são fornecidas e devem usar um cronômetro para marcar o tempo levado para completar cada bloco de cada tarefa. Quaisquer diferenças nas respostas motoras necessárias para as respostas orais e/ou para virar as páginas ou passar entre telas são controladas internamente na maioria das tarefas (com exceção das de atualizações). Ou seja, a maior parte dos testes incluem blocos que envolvem tarefas ligeiramente diferentes. Há blocos nos quais são necessárias várias habilidades cognitivas, mas pouco em termos de funcionamento executivo específico; há também um bloco que envolve as mesmas habilidades, mas tem um requisito executivo adicional. Escores incluem medidas de custo, isto é, quanto tempo extra é necessário para executar a tarefa nos blocos que incluem as habilidades executivas de interesse em comparação com os blocos sem o requerimento executivo (ou aumento de erros).
As instruções foram elaboradas com o fito de serem as mais simples possíveis para não dificultar o entendimento das tarefas. Exemplos e estímulos para praticar as tarefas também são fornecidos. No entanto, estes são foram mantidos a um mínimo porque muita prática pode levar as pessoas a desenvolver estratégias para a execução da tarefa e, portanto, depender cada vez menos de funções executivas à medida que a tarefa progride.
Quando possível, adaptamos as tarefas para terem estímulos preto, branco e cinza para permitir o uso em pessoas com acromatopsias/discropatopsias, vulgarmente conhecidos como daltônicos. O fundo foi mantido branco quando possível, para tornar as tarefas mais baratas de imprimir em cartões. As instruções são apresentadas na mesma fonte (Calibri) e em tamanhos fáceis de ler. Os estímulos utilizados foram selecionados de forma a representar objetos que são facilmente reconhecidos e nomeados por crianças pequenas, de modo a garantir que todos os tipos de examinados os conheçam.
Evitamos utilizar letras como estímulos, substituindo-os por números, que são mais fáceis para examinandos com escolaridade baixa ou inadequada. Ao menos uma tarefa de cada tipo de função executiva não envolve letras/palavras escritas e pode ser empregada em indivíduos analfabetos, desde que as instruções sejam lidas para eles.
As instruções gerais dadas a cada examinado, antes de iniciar a bateria de tarefas, devem explicar que eles cometerão muitos erros e que até adultos muito espertos e altamente instruídos os fazem. Portanto, cometer erros e esquecer-se durante as tarefas não significa que a pessoa tem problemas. Os examinados devem ser encorajados a fazer o melhor que podem e não ficar chateados se erros forem cometidos. Por esse motivo, nas instruções usamos sentenças como “quando você esquece…”. Usamos “quando” e não “se” para deixar claro que esperamos erros e que eles fazem parte das tarefas. Também usamos a palavra “atividade” nas instruções e não a palavra “teste”, para tentar remover a ideia de que os examinados estão sendo testados. Eles também devem poder descansar entre blocos e tarefas, porque elas são difíceis de fazer, independentemente da escolaridade e do quociente de inteligência dos examinados.
Atenção: Os testes executivos da bateria FREE são para pesquisas e não servem para diagnóstico, pois ainda não há normas brasileiras de desempenho.
Referências bibliográficas
Friedman, N. P., & Miyake, A. (2017). Unity and diversity of executive functions: Individual differences as a window on cognitive structure. Cortex, 86, 186-204.
Zanini, G. A., Miranda, M. C., Cogo-Moreira, H., Nouri, A., Fernández, A. L., & Pompéia, S. (2021). An adaptable, open-access test battery to study the fractionation of executive-functions in diverse populations. Frontiers in psychology, 467.